A GRÉCIA NÃO É AQUI, MAS A LÓGICA FINANCEIRA É A MESMA . E CORRÓI.

Nos últimos 12 meses, o juro da dívida pública custou R$ 213,9 bi ao Brasil. Para honrar seus credores, o Estado fez um arrocho de gastos e conseguiu reservar R$ 119,6 bi do total da receita de impostos, compondo assim o superávit primário, todavia insuficiente para suprir a pantagruélica bocarra rentista .

O rombo não pago, R$ 94,3 bi, ou 2,5% do PIB, foi acrescido ao saldo da dívida que desse modo não cessa de aumentar, mesmo quando o governo gasta menos do que arrecada. Sempre é bom cotejar valores etéreos das finanças com unidades de medida mais terrenas. Uma delas é o custo do Bolsa Família, o maior programa social de transferência de renda do mundo. Um ano de Bolsa Família custa R$ 17 bi aos cofres públicos.

Beneficia 53 milhões de brasileiros. Vamos sentar para não cair de susto: o juro da dívida pública pago nesses 12 meses permitiria multiplicar por doze vezes e meia o benefício médio do Bolsa Família, o que propiciaria a cada lar inscrito no programa uma renda de R$ 1.400 reais por mês, contra média de R$ 155,00 atuais. Não é uma proposta.Mas uma ilustração do que se sacrifica desviando tal volume de recursos para um universo proporcionalmente insignificante de privilegiados.

Infelizmente, a tendência é que esses paradoxos e discrepâncias se acentuem. Não porque o governo seja perdulário, como dardeja a ortodoxia militante dentro e fora da mídia. Mas, entre outras coisas, porque o nível de juro com que o país ingressou na crise mundial já era absurdo. Qualquer variação para cima, agora, realimenta uma dinâmica autodestrutiva, mantidas as ferramentas convencionais de política econômica.

Harmonizar o controle da inflação, por exemplo (que, segundo a ortodoxia, requer um juro real de 8% até dezembro, contra 7% atuais) e, ao mesmo tempo, conter o tsunami de capitais especulativos que desembarcam no país, virou um jogo de perde-perde . Perde-se com a alta dos juros, de um lado e também com a valorização da moeda brasileira pela indigestão de dólares atraídos pelos juros siderais. Deixa-se de gerar empregos e riquezas para conter a inflação. Ao mesmo tempo, exporta-se empregos e produção deslocando-se demanda para produtos importados, barateados pela distorção cambial.

Este ano, o superávit primário foi de R$ 45,452 bi de janeiro a maio. O valor é 87,6% superior ao registrado um ano antes. A Grécia não é aqui. Mas há várias tragédias embutidas nesses números -talvez o fato de nos habituarmos a eles seja a maior delas.

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