Ateus de Brasília saem do 'armário' e se organizam
Paulo Lopes
Eles concluíram que não existem evidências fortes o suficiente para acreditarem em uma divindade, um sistema religioso ou mesmo em vida após a morte. Decidiram aparecer, assumir as convicções e exigir respeito pelas escolhas e liberdade para as próprias opiniões. E têm a falta de fé como sinônimo de liberdade. A moral, para pessoas como o estudante de direito Pedro Alcântara, 22 anos, e Glorinha Silva, 56, uma das fundadoras da Associação Ateísta do Planalto Central, nasce da empatia pelo próximo, das consequências dos próprios atos e das leis do homem. Eles são ateus.
Estudo da Companhia de Planejamento do Distrito Federal (Codeplan), feito em 10 regiões administrativas, indicou que o número de pessoas que se declaram sem religião (ateias ou não) subiu de 3,8%, em 2011, para 6,9%, nos primeiros seis meses de 2013.
A população nessas localidades cresceu de 882.072 habitantes para 943.737 nos últimos dois anos. No mesmo levantamento, o órgão informa que, de 2000 a 2010, o número de pessoas sem religião aumentou de 14,5 milhões (7,4% da população) para 16,9 milhões (8,6%) nacionalmente.No DF, passou de 200 mil (8%) para 230 mil (9,2%).
Na visão do biólogo evolucionista Richard Dawkins, militante ateu internacional, a quantidade de descrentes parece menor porque as pessoas têm medo de se assumir.
Glorinha Silva (foto) precisou de coragem para tomar a decisão. Ela enfrentou a desaprovação dos próprios filhos quando se revelou descrente. Também perdeu namorados e viu pessoas próximas se distanciarem.
“As pessoas têm que nos reconhecer como ateus, com os mesmos direitos que os outros, inclusive para falarmos da nossa descrença. Na mente das pessoas, o ateu é ruim por não estar com Deus”, afirma.
Glorinha explica que é um equívoco pensar que “quem não está com Deus, está com o diabo”. “Precisamos informar a população sobre o ateísmo, desmanchar essa má impressão. O preconceito é velado, mas existe. A maioria dos políticos declaram uma fé. Um que se diga ateu dificilmente será eleito”, explica.
A professora era católica mas, ao questionar os dogmas da religião, nunca encontrou respostas satisfatória. Passou a olhar criticamente para as frustrações da vida sem atribuí-las a causas externas. “Sou responsável pelos meus atos. Não espero recompensas por ser boa. Criei os meus filhos dentro dos costumes católicos. Como o tempo, eles se acostumaram com minha postura”, lembra.
Moradora de Samambaia, a pedagoga Priscila Nascimento, 23, se descobriu ateia ao ler e estudar a Bíblia dentro de uma igreja evangélica. Supostas contradições no texto dito sagrado e respostas vazias de líderes teriam fundamentado a descrença da garota. Assumir-se, demandou força de espírito.
“Tive que enfrentar família e amigos. Na igreja, conversei com uma líder, expliquei minha posição, pedi para não ser evangelizada e não voltei mais. O desprendimento foi libertador. Eu me sentia muito oprimida. Hoje, sigo minha moral, o que eu acho certo.”
Mesmo não acreditando, ela demonstra respeito. “Meu namorado é evangélico e a família dele também. Ele vai a encontros ateus comigo e eu, em um evento religioso com ele. Não tenho interesse de ‘desconverter’ pessoas. Só que me respeitem”, sorri.
No Censo de 2010, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) calculou em 19.885 o número de ateus no DF. Também levantou em 4.150 os agnósticos da região. De acordo com a pesquisa, os descrentes estão em terceiro lugar no ranking da religiosidade na capital, atrás apenas de católicos (1,4 milhão) e evangélicos (670 mil). No Estado de São Paulo, o número de ateus é de 166.121, e 99.384 no Rio de Janeiro.
Visões do ateísmo
por Agnaldo Portugal, professor de Filosofia da Religião na Universidade de Brasília
O conceito de ateísmo inclui muitas visões. Depende, por exemplo, de qual deus a pessoa nega. Os cristãos eram acusados de ateísmo no império romano, e Sócrates, por sua vez, na Grécia.
Temos ateísmo em toda a história da humanidade e até algumas passagens bíblicas comprovam isso.
Hoje, ateu é aquele que nega qualquer tipo de ser sobrenatural e não tem nenhuma visão religiosa.
Em sua maioria, essas pessoas são de classes sociais mais elevadas ou com tem nível de escolaridade maior. Também é uma postura comum no meio acadêmico.
Nessas condições, o naturalismo, a visão científica do mundo é mais bem difundida. São uma minoria.
No Censo de 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o número de ateus e agnósticos juntos não chega a um milhão no país.
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