A arte de escrever ao contrário


Há uma indignação na internet com a atitude de Jorge Bastos Moreno, colunista de O Globo, por ter retirado de seu blog o texto de um colaborador – Theófilo Silva – onde se mencionava, en passant, a intimidade entre o “empresário de jogos” (era assim que a revista se referia a ele, como no texto ao lado) Carlinhos Cachoeira e o editor daVeja Policarpo Júnior.
Moreno está sendo acusado de não resistir e até se associar à cortina de silêncio que se quer fazer sobre os 200 telefonemas trocados entre ambos.
Com a mais completa compreensão aos indignados com o que parece – e é – censura ao texto de Theófilo, vejo tudo de forma completamente diferente. Mesmo correndo o risco de “apanhar” de alguns comentaristas, digo qual é minha visão.
Jorge Bastos Moreno é quem foi censurado, porque alguém decidiu que, na coluna eletrônica publicada em seu nome, algo não poderia ser dito.
Moreno tem inteligência suficiente para argumentar, se o quisesse, que uma linha e meia de menção a Policarpo lá pelo décimo ou décimo-quinto parágrafo de um post faria muito menos estrago que a retirada do artigo.
Se Moreno acatou a censura – o que é comum nas redações – fez algo que é raro, raríssimo: publicou a censura, inclusive dando o nome de quem foi o portador da ordem de expurgo do artigo.
Mostrou o boi e o nome do boi, quando podia publicar apenas duas linhas, dizendo – no máximo – que o artigo não respeitava as normas da redação.
Moreno, que se encarna num personagem um tanto bufo e marcado pela cordura, deu seu jeito de informar a verdade, com uma ironia que nem ele próprio pode confirmar aos seus botões.
Ficou numa “saia-justa” em relação à sua propria credibilidade, mas mostrou o que ocorreu, com todas as letras. Deu-se ruidosamente a bater.
Nunca uma cortina de silêncio foi baixada com tanto barulho…
Em “Memórias do Cárcere”, Graciliano Ramos – perdoem as eventuais incorreções, cito de memória – disse: “Liberdade completa ninguém desfruta: começamos oprimidos pela Sintaxe e terminamos às voltas com a Delegacia de Ordem Política e Social. Mas nos estreitos limites a que nos coagem a Gramática e a Lei, ainda podemos nos mover”.
Numa tradução livrea, Moreno foi puro Macunaíma,  o “herói sem caráter” do Mário de Andrade
Talvez sem querer, admito, embora duvide, porque estamos “rodados” demais para isso.
Só se foi como o Chaves (o mexicano, não o venezuelano, paciente do Dr. Merval): sem querer, querendo.

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