Joel Leite: Venda de automóveis zero bate recorde, ainda com margens de lucro astronômicas


por Luiz Carlos Azenha no Viomundo

No corpo do texto ela mencionava reportagem que havia feito com o jornalista Joel Leite, do Auto Informe, que também mantém o blog O Mundo em Movimento.

Joel é autor de uma investigação que demonstra que os preços astronômicos dos automóveis no Brasil não resultam apenas dos insumos mais caros ou da carga tributária: são resultado, também, do que ele batizou de Lucro Brasil, ou seja, grandes margens de lucro praticadas pelas montadoras.

Falar em Lucro Brasil é uma forma irônica de se referir ao chamado Custo Brasil, que empresários e jornalistas frequentemente usam para tentar vender reformas neoliberais — a redução de direitos trabalhistas, por exemplo — ou para justificar preços completamente divorciados da realidade.

O texto da Heloisa, mais uma reportagem que eu mesmo fiz sobre os automóveis brasileiros, que reproduzi aqui, causaram animado — para não dizer furioso — debate entre os internautas.

O Fábio Passos, por exemplo, argumentou que parte dos reclamos da Heloisa se devia à sobrevalorização do real. Sim, mas nem sempre, como notou o Luiz P, que respondeu:

“Acho que vc não entendeu a ideia do artigo. Lá diz que quando um produto que custa, por exemplo, US$100,00 nos EUA, e por aqui chega a R$500,00 é um caso de especulação. Cito o exemplo baseado em valores concretos de tênis de corrida.

Vamos ilustrar com dois cenários:
1 – Real com valor considerado normal US$1,00 = R$2,50
Pelo câmbio o tênis de US$100,00 deveria custar aqui R$250,00. Então quando ele custa R$500,00 está pelo dobro do preço.

2 – Real hipervalorizado US$1,00 = R$1,60
Pelo câmbio o tênis de US$100,00 deveria custar aqui R$160,00. Então quando custa R$500,00 está mais de três vezes mais caro.

Isso mostra que produto estrangeiro absurdamente caro em um quadro de supervalorização da moeda nacional só pode ser fruto de especulação desenfreada. Nesse quadro os produtos estrangeiros deveriam estar mais baratos. O que acontece por aqui é caso de polícia…”.

Tratando especificamente dos automóveis, destaco alguns comentários:

Marcelo de Matos disse que o problema é o cartel das montadoras; Felipe atribuiu os preços à falta de concorrência; Rodrigo aft disse que o CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) não trabalha em defesa da concorrência; Ricardo Alves afirmou que falta ao brasileiro a paciência para pechinchar (ele mesmo diz ter obtido um abatimento de 7 mil reais na compra de um carro zero); Francisco Hugo afirmou que o fato de as montadoras terem suas próprias financeiras faz com que elas ajam também como ‘atravessadoras’; Sergio Navas, que conhece o ramo da siderurgia, alegou que o preço da tonelada de aço laminado longo é de U$ 1.600 no Brasil, contra U$ 830 nos Estados Unidos e U$ 750 na China;Alexandra Peixoto destacou a concentração da cadeia produtiva no Brasil e recomendou este artigo da economista Tânia Bacelar; o David Bonis recomendou a leitura do artigo de Pedro Kutney, do Automotive Business, chamado Os custos, os preços e os bobos.

Noir, num desabafo, disse que “os governos que o Brasil teve ao longo de sua existência foram Governos que governaram para os outros, notadamente os de fora”.

Disse mais:

Bem, sabemos que as coisas boas, somente são boas se funcionam; assim o “capitalismo brasileiro”, transformou-se em um “capitalismo de esgoto”, altamente explorador, selvagem, que não contribui com sua sociedade. Nosso capitalismo é exatamente a “política colonial ” empregada entre 1500 e 1900, extrativista. A diferença é que antigamente se extraia o pau-brasil, ouro, prata, manganês, quartzo, diamantes e no Brasil [de hoje] se extrai “dinheiro”.

O tom do desabafo da Noir me lembrou muito o do jornalista Lúcio Flávio Pinto, já que a ideia subjacente é a mesma: o Brasil como extraordinária fonte de lucros.

[Lúcio tratou do ritmo de exportação de minério de ferro de Carajás -- crime de lesa Pátria, segundo ele --, lamentou a exportação de energia brasileira embutida em lingotes de alumínio destinados ao Japão e afirmou que a Amazônia brasileira está sendo transformada em uma subcolônia -- primeiro, do Sudeste, depois de estrangeiros -- para exportação de energia]

Todos os comentários acima citados e muitos outros, tão importantes quanto, estão aqui e aqui.

Com a notícia publicada pelo Estadão de que nos últimos três anos e meio as montadoras remeteram para as matrizes U$ 14,6 bilhões em lucros e dividendos, achei que tinha chegado a hora de entrevistar o Joel Leite a respeito, levantando com ele as questões mencionadas pelos comentaristas.

Outro motivo da entrevista: a venda de automóveis no Brasil disparou em junho, com a saída de até 20 mil veículos zero num único dia, recorde histórico.

Segundo Joel, as vendas bateram recorde mas não foi por conta da redução da margem de lucro. Pelo contrário, algumas montadoras aproveitaram para recompor sua lucratividade.

O jornalista afirma que os preços de automóveis não caem abaixo de um determinado patamar e deu como exemplo do poder de fogo da Anfavea (Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos) a sobretaxa que foi aplicada contra a suposta “ameaça chinesa”.

O Cherry QQ chegava ao Brasil, já com acessórios, a 12 mil reais, mas como ameaçava a produção das empresas instaladas aqui acabou sobretaxado por pressão das montadoras locais. Isso quando a Cherry e a JAC (outra montadora chinesa) detinham apenas 0,6% do mercado, contra 70% da General Motors, Fiat, Volkswagen e Ford.

Joel também comenta campanhas do gênero da Abaixo o Lucro Brasil, ativa no Facebook.




Quais são as últimas do mercado automobilístico?
Joel Leite: O mês de junho fechou com vendas recordes, aumento de vendas históricos. Para você ter uma ideia, o mês teve só 20 dias úteis, sendo que um deles  ainda foi espremido junto ao feriado, quer dizer, você pode considerar 19 dias úteis. Mas mesmo considerando 20, você teve 17 mil carros por dia vendidos. Para você ter uma ideia do que isso significa, nesses últimos anos, quando as vendas estão bombando, o mercado crescendo, as vendas tem sido de 13 mil carros por dia, 14, eventualmente 15 num mês muito especial. Neste mês de junho a média foi 17, na última semana foram 20 mil carros por dia. Isso resultado do que? Da redução dos preços em consequência da retirada do IPI para carro 1.0 e redução do IPI para carro acima de 1.0, que o governo fez no final do mês de maio. Quer dizer: abriu a mão do imposto e com isso vários carros, várias montadoras abaixaram o preço, não todos, por sinal, mas foi o suficiente para provocar essa corrida às revendas, foi realmente uma procura enorme, que é possível até que não se mantenha nos próximos meses, é um pouco artificial, mas contribuiu para isso, para ser o segundo maior mês da historia e a maior venda diária de toda a história da indústria.

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