Cuba desenvolve vacina contra câncer de pulmão

Nassif

Do UOL
Cuba registra primeira vacina terapêutica contra câncer de pulmão

HAVANA, 10 janeiro 2011 (AFP) - Cuba registrou a primeira vacina terapêutica contra o câncer de pulmão, após testar sua eficácia em mais de mil pacientes sem que tenham ocorrido efeitos colaterais, informou esta segunda-feira uma autoridade científica.

"Foram mais de 15 anos de pesquisas", disse ao semanário 'Trabajadores' Gisela González, chefe do projeto desta vacina - denominada CIMAVAX-EFG -, cujo objetivo é transformar o câncer de pulmão avançado em uma doença crônica controlável.

O registro permite usar a vacina maciçamente no país, bem como nos mil pacientes aos quais foi administrada durante os testes, e "atualmente seu registro avança em outras nações", disse a especialista.

"Uma vez que o paciente termina o tratamento com radioterapia ou quimioterapia e é considerado um paciente terminal sem alternativa terapêutica, neste momento é aplicada a vacina, que ajuda a controlar o crescimento do tumor sem toxicidade associada, e pode ser usada como um tratamento crônico que aumenta a expectativa e a qualidade de vida do paciente", ressaltou.

A vacina "está baseada em uma proteína que todos temos: o fator de crescimento epidérmico", acrescentou González.

"Igualmente se avalia a forma de empregar o princípio desta vacina em outros tumores sólidos (em próstata, útero e mama), que podem ser alvo deste tipo de terapia. Existem resultados importantes, mas é preciso esperar", concluiu.

É interessante publicar a resposta de uma leitora que comenta um comentário sobre a notícia;

Seguem os dois comentários:


Deve ser só a imprensa brasileira que dá bola para as pataquadas que saem da ilha-prisão dos Castros.
Ninguém mais leva a sério essas histórias da carochinha sobre o maravilho sistema de saúde cubano.
Rafael Gonzaga
 
Lamento informar, mas à primeira vista o trabalho parece ser sério. Gabriela González é associada a dez artigos sobre a vacina em periódicos internacionais revistos por pares em língua inglesa nos últimos doze anos, incluindo Current Cancer Drug Targets e Annals of Oncology, ambos com fator de impacto cinco.

(É pouco para os padrões internacionais, mas há que considerar que, com o embargo, a pesquisa em Cuba avança devagar e publica com baixa freqüência.)

Acabo de passar os olhos numa revisão sobre a vacina publicada no periódico MEDICC Review, a incluir o piloto número cinco (ensaio clínico controlado fases I e II, com distribuição aleatória), encerrado em 2005. A vacina age na via do fator de crescimento epidermóide - um alvo legítimo dos cânceres de pulmão não-pequenas células. Os dados parecem estatisticamente significativos e indicam um prolongamento na sobrevivência de pacientes com tumores IIIB e IV - um avanço considerável em se tratando de câncer de pulmão. Um artigo mais recente acompanha uma coorte de 58 pacientes que receberam vacinação de longo prazo, mas este se encontra indisponível em meu serviço de comutação bibliográfica.

Se a vacina foi licenciada, provavelmente cumpriu o ensaio fase III. Trata-se de uma terapia de resgate para aumentar a sobrevida e prolongar sua qualidade em pacientes que não responderam à quimioterapia e/ou à radioterapia. Ou seja, eles não fazem afirmações grandiloqüentes ou estapafúrdias e se dedicaram a um nicho de imunoterapia contra o câncer que é padrão em oncologia: como terapia de complementação a pacientes desenganados. O tipo de trabalho em nada difere de pesquisas similares feitas no MD Anderson, no Memorial Sloan-Kettering ou em outros centros de referência. É uma boa notícia para pacientes que querem sentir o gostinho da vida por mais algum tempo. Se ela cumpre os princípios da não-maleficência e da beneficência, mesmo que não seja a cura - e ninguém disse que seria - está valendo.

Eles usam um adjuvante bacteriano, de forma similar a um grupo brasileiro que usa uma vacina de DNA baseada num gene do bacilo de Hansen para evocar proteção contra agentes infecciosos e que também está em avaliação para combate a tumores de cabeça e pescoço. Não há nada de mágico, nenhuma fantasia: o material que li é lacônico e sóbrio. E quinze anos é um prazo razoável para o desenvolvimento de uma vacina, compatível com valores internacionais.

Só falta o colega vir me dizer que os dados publicados foram todos forjados. Não é impossível: eles não seriam os primeiros. Pesquisadores coreanos e estadunidenses têm sido freqüentemente demitidos por incluírem dados falsos em suas publicações. Mas acho improvável: Cuba tem recursos escassos e não licenciaria para uso doméstico uma vacina que não funcionasse. Seria desperdício de dinheiro e tempo.

Aliás, tecnologicamente, trata-se de uma vacina simples, compatível com a pouca disponibilidade de insumos de alta complexidade para a pesquisa na ilha. Foi só uma boa idéia levada adiante com paciência e tenacidade. Deveria servir de lembrança aos fascinados com tecnologia que nada substitui uma idéia consistente. Nesse sentido, sempre me lembro de uma anedota, provavelmente inverídica e criada por um comunista em dia de bazófia, mas ilustra um padrão de raciocínio desesperadoramente comum nos dias que correm. No início da corrida espacial, surgiu o problema de como os astronautas e cosmonautas fariam anotações em microgravidade e no vácuo. Os estadunidenses investiram um caminhão de dinheiro para desenvolver uma caneta pressurizada que ejetasse pigmentos químicos que fossem imediatamente absorvidos pelo papel, mesmo em extremos de temperatura, no vácuo e em superfícies incomuns. Os soviéticos usaram um lápis.

E o que torna a saúde em Cuba decente é o fato de que os meios limitados os obrigaram a dar ênfase na única coisa que funciona: prevenção. Nada de alta tecnologia desnecessariamente ou soluções mirabolantes. Deve funcionar... afinal, eles continuam empatados em 36º com os EUA em expectativa de vida gastando vinte vezes menos por habitante. Mas no caso de câncer de pulmão, Cuba é produtora de tabaco e é de se esperar que o controle seja difícil (o que só mostra que o socialismo e a hipocrisia são compatíveis, já que é um contrassenso que um governo que procura dar uma saúde de qualidade aos seus produza tabaco). Este gráfico mostra que o fardo epidemiológico do câncer de pulmão é semelhante em Cuba e nos EUA.

Sinceramente, essa carolice política enche a qualquer momento, mas ela se torna particularmente repugnante quando infecta assuntos científicos. Faço votos de que o colega jamais precise tomar um avião para Havana para se tratar de algo. Por que cargas d'água um avanço em oncologia só vale se vier de um país da OCDE?

Reparem que não se trata de uma bravata solta no ar, como a dos malucos norte-coreanos que alegaram ter desenvolvido um reator de fusão nuclear ano passado: o registro da vacina é simplesmente um corolário de um processo bem documentado de pensamento científico e ensaios clínicos em acordo com as normas universais de desenvolvimento de estratégias terapêuticas. Será que os pacientes e familiares não podem comemorar em paz sem um fugitivo da Guerra Fria ou enrustido do CCC para chatear?
H. C. Paes

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