Os números da economia antes da bola rolar

Os donos da bola

Carlos Motta | Para o Valor, de São Paulo


Neymar, Messi e Cristiano Ronaldo são, merecidamente, os destaques desta Copa do Mundo pelo que têm jogado nos últimos anos. Sem eles a competição perderia muito em técnica, emoção e beleza. Da mesma forma, o evento seria bem menos atrativo se fosse disputado com a infraestrutura esportiva que o Brasil dispunha antes do torneio.

Os estádios construídos ou reformados nas 12 cidades-sede da Copa, no moderno conceito de "arenas multiuso", ou seja, projetados para serem utilizados pelo público todos os dias, já que contam com bares, restaurantes, área de comércio e serviços, espaços para festas e shows, colocaram o Brasil no mesmo nível de países onde o futebol é bem jogado também fora dos gramados.





Erguidos sob a chancela do "padrão Fifa", os estádios da Copa marcam um novo estágio para o atleta brasileiro, que vai poder agora jogar em gramados iguais aos melhores da Europa e com ótima iluminação, para o torcedor, que contará com mais segurança e conforto, e para clubes e empresas, que terão a possibilidade de lucrar com a sua exploração comercial.

A construção desses 12 gigantes esportivos não foi, porém, uma tarefa fácil.

Para poder abrigar, no total, 668 mil torcedores, o equivalente à população de Aracaju, oferecendo a esse público cerca de 500 bares e restaurantes e 35 mil vagas de estacionamento, uma complexa e extensa cadeia de fornecedores teve de ser montada pelas construtoras, abrangendo desde a elaboração de sofisticados projetos arquitetônicos até a instalação de gramados de última geração. Os números escondidos nas obras não deixam dúvidas sobre sua magnitude.

A Andrade Gutierrez, que participou da construção de quatro estádios - Mané Garrincha, em Brasília, Arena da Amazônia, em Manaus, novo Maracanã, no Rio, e o Beira Rio, em Porto Alegre-, chegou a ter 6,2 mil funcionários na obra do Distrito Federal, onde foram consumidos 200 mil metros cúbicos de concreto, 25 mil toneladas de aço e 1,5 milhão de metros de cabos.

As estruturas metálicas da Arena da Amazônia pesam 6,3 mil toneladas, o equivalente a 4,8 mil carros populares. O concreto consumido, 61 mil toneladas, equivale ao volume de 24,5 piscinas olímpicas. Na reforma do Maracanã trabalharam 9,6 mil trabalhadores contratados diretamente pelo consórcio de construtores e cerca de 5 mil nas empresas subcontratadas, o correspondente a um pequeno município.

Essas empresas que mergulharam na onda da Copa, além do lucro das encomendas para as obras, obtiveram uma oportunidade única de alavancar os negócios, faturar mais e mostrar a qualidade de seus produtos numa vitrine que está sendo exposta a um enorme público, formado por pessoas do mundo todo.

É o caso da Greenleaf Gramados, que, segundo Flavio Piquet, seu sócio e diretor-financeiro, conseguiu, depois de cumprir contratos para colocar 36 hectares de grama natural e 4 hectares de grama sintética em sete estádios, 11 centros de treinamento e nove estádios-base, consolidar a posição de liderança no mercado brasileiro. "Estamos agora muito mais distantes da concorrência, a marca apareceu muito, a ponto de sermos assediados por diversas empresas de investimentos." Luís Pires, sócio da Mored, do Grupo Manzato, que forneceu parafusos autoperfurantes, usados na fixação de coberturas metálicas, diz que um terço do crescimento do faturamento da empresa no ano passado, de 30%, está relacionado às obras da Copa.

Cerca de 2 milhões de unidades foram fabricadas para seis dos oito estádios que utilizaram parafusos para fixar suas coberturas metálicas.

Encarregada da construção e montagem da cobertura de três estádios - Fonte Nova, Castelão, em Fortaleza, e Arena da Amazônia -, a Martifer, de acordo com seu diretor-comercial, Francisco Santos, viu o faturamento aumentar mais de 50% no seu primeiro ano de atividade no Brasil, por causa desses contratos. "Em um mercado tão competitivo, as grandes arenas foram a porta de entrada que a Martifer precisava para mostrar o seu trabalho e colocar-se junto às maiores e melhores empresas do país", afirma. A Martifer é controlada por uma multinacional portuguesa e está no Brasil desde 2010.

Para o escritório Fernandes Arquitetos Associados, projetar o novo Maracanã e a Arena Pernambuco representou vários desafios. No Maracanã, o principal foi tornar o estádio público tombado em uma arena moderna e eficiente, mantendo suas principais características de 60 anos de história. "Era preciso fazer um novo Maracanã 'nascer' dentro do antigo, de forma a não substituir o existente, mas sim, renová-lo", diz o arquiteto Daniel Hopf Fernandes. Assim, algumas estruturas deixaram de existir para dar lugar a outras, "novos elementos foram incorporados e os espaços remanescentes foram recuperados."

Já em relação à Arena Pernambuco, a principal particularidade do projeto é o fato de ele não estar inserido dentro de uma malha urbana consolidada. "O desafio foi criar uma edificação totalmente integrada ao meio ambiente natural e que, num segundo momento, pudesse estabelecer uma relação de unidade com o futuro desenvolvimento urbano previsto para a região."

O trabalho da Aquastock, que instalou 18 filtros de água de chuva para o Maracanã e dois kits de interligação de água potável com água de chuva para a Arena Pernambuco, segundo Marcos Barros, diretor da empresa, foi menos complicado e feito por uma equipe de apenas cinco pessoas. Mas foi bastante comemorado pela empresa, que já está agora de olho nas obras da Olimpíada de 2016, no Rio. Os filtros são fabricados na Alemanha, pela WISY. "O contrato do Maracanã foi responsável por 20% do faturamento em 2012", informa Barros.

A AkzoNobel, que produziu desde tintas decorativas para paredes até revestimentos especiais para a estrutura metálica das arquibancadas, coberturas e mezaninos de sete estádios da Copa e da nova Arena Grêmio (Porto Alegre), viu no evento, segundo Jaap de Jong, diretor para Brasil e América Latina, uma oportunidade de apresentar ao mercado brasileiro a qualidade e o diferencial de alguns de seus produtos.

Sua concorrente, a PPG Tintas Renner, participou da construção da Arena da Baixada, em Curitiba, e do Beira Rio, em Porto Alegre. Segundo Ricardo Cappra, coordenador de marketing, a Renner é a marca de tintas mais lembrada no Rio Grande do Sul e a participação nas obras dos estádios valorizou mais a imagem da empresa na região Sul.

Para a Docol, fabricante de metais sanitários, estar presente em 11 dos 12 estádios da Copa foi, segundo o diretor-comercial, Guilherme Bertani, "de extrema importância." A linha antivandalismo, cuja torneira foi projetada para ser instalada em locais públicos com grande circulação de pessoas, com elevada durabilidade, resistência a atos de depredação e furto, foi muito usada nos estádios.

O fornecimento para cada arena correspondeu, em média, a 26% a mais de produtos vendidos, por exemplo, para um hospital de grande porte, sete vezes mais que um grande shopping center e 11 vezes mais do que foi feito para um aeroporto.

Embora seus produtos tenham sido usados nos 12 estádios da Copa, a Steck, fabricante de materiais elétricos, encarou as encomendas para o evento como uma operação normal, correspondendo a um negócio de médio porte. Os contratos para o fornecimento de materiais (plugues, tomadas, disjuntores, caixas e quadros para ligações dos canteiros de obra) somaram R$ 2 milhões.

Outra empresa que participou da construção de todos os novos estádios foi a Aperam, que forneceu 500 toneladas de aço inoxidável para eles. O Castelão foi a melhor vitrine para seu produto, presente nos 2.300 painéis que revestem 11 mil metros quadrados de fachada, que consumiu 80 toneladas de aço.

Muito menos visível para o torcedor dentro de um estádio, a cobertura de telefonia celular indoor das operadoras foi concluída poucos dias antes do início da Copa. No total, 4.738 antenas fazem parte da infraestrutura interna instalada pelas prestadoras nas arenas multiuso para permitir ligações, navegar na internet e mandar mensagens multimídia, com texto, fotos e vídeos. Claro, Oi, Nextel, Tim e Vivo fizeram uma parceria para um projeto único, com investimentos de R$ 226 milhões e infraestrutura compartilhada.

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