Novidades muito velhas

Colunista

Cláudio Gonçalves Couto
A última pesquisa CNI/Ibope traz, de novo, velhas novidades. A ultrapassagem de José Serra por Dilma Rousseff confirma expectativas baseadas na longa trajetória, como assinalado na coluna de 30 de março de 2010 ( www.valoronline.com.br/impresso/politica/99/6184569/novidades-muito-velhas ). Nela apontei que o distanciamento então indicado pelo Datafolha em favor Serra era um repique estatístico, não ofuscando um cenário geral alentador para a candidatura situacionista. 

As tendências de longo prazo ficam claras quando se consideram, com o devido tratamento estatístico, as pesquisas eleitorais realizadas por diferentes institutos nos últimos dois anos, agregando os resultados. É o que faz Marcus Figueiredo, do Iuperj em sua "Pesquisa das Pesquisas". Ajustando-se graficamente os resultados das enquetes, as tendências de longo prazo ficam nítidas (veja-se o gráfico em www.papopolitico.com.br/wp-content/uploads/2010/05/doxa_papopolitico_png_20_maio.png ).

Portanto, nada surpreende neste último levantamento, embora alguma oscilação (como a verificada no Datafolha do fim de março) sempre possa acontecer. Por isto, sabendo-se que as lideranças partidárias são bem informadas sobre o que está a ocorrer, a surpresa do presidente do PSDB, senador Sérgio Guerra, pode ser tomada como um golpe de retórica destinado a não acusar o golpe e melhorar o moral da tropa. Fôssemos levar a sério sua alegação de que as pesquisas internas do partido mostram outro resultado, seria o caso de sugerir-lhe que mudasse o fornecedor das enquetes, pois estaria sendo desinformado.

Para além das velhas novidades trazidas pelo último levantamento, o que merece maior destaque é a projeção da possível vitória da candidata situacionista já no primeiro turno. Na pesquisa em que aparecem todos os candidatos, inclusive os nanicos, Dilma obteria hoje 47,8% dos votos válidos. Faltar-lhe-ia pouco para atingir os 50% + 1 dos sufrágios necessários para uma vitória na primeira rodada. Para que se tenha idéia mais clara de quanto isto representaria no total do eleitorado, incluídos os que afirmam que votariam em nulo ou branco e também os que ainda não sabem o que farão, para ganhar no primeiro turno a candidata do governo teria de avançar dos atuais 38,2% medidos pelo Ibope para 41,8%, uma subida de 3,6% (cenário 1 da tabela abaixo). Isto, claro, desde que a intenção de voto nos demais não crescesse também. Projetemos outros cenários hipotéticos, sempre mantendo as atuais intenções de voto nulo ou em branco, de 6,3% (número plausível, considerando-se que nas quatro últimas eleições os nulos e brancos declinaram - 18,8%, 18,7%, 10,4% e 8,4%, respectivamente).
Foto Destaque
Os indecisos representam, hoje, 13,8% do eleitorado; se Dilma abocanhasse apenas metade deles, indo outra metade para seus oponentes, ainda teríamos um segundo turno. Entretanto, se abocanhasse dois terços dos atuais indecisos, ultrapassaria os 50% dos votos válidos e se elegeria sem a necessidade da segunda rodada (cenário 2 da tabela). Ambas são situações plausíveis, mas há um fator reforça a segunda: a atual intensificação do crescimento das intenções de voto feminino em Dilma - ela ganhou 8% entre as mulheres, contra "apenas" 5% entre os homens. 

Historicamente as pesquisas eleitorais apontam que o público feminino demora mais do que o masculino para definir seu voto, permanecendo por mais tempo indeciso; hoje, a proporção de mulheres que não sabem como votarão é três pontos percentuais superior à dos homens. Isto se deve a que, de um modo geral, o público feminino informa-se menos sobre política do que o masculino: para o Ibope o percentual de mulheres que identifica Dilma como a candidata de Lula é 9 pontos menor que o de homens (68x77), embora um percentual similar dos dois gêneros manifeste a intenção de votar na candidatura apoiada pelo atual presidente (49x48). À medida que as mulheres forem se informando mais sobre a campanha, sobretudo após o início da propaganda no rádio e na TV, maior a chance de crescimento da candidata do governo.

Acrescente-se que 55% dos eleitores afirmam "conhecer pouco", "só de ouvir falar", ou "não conhecer" Dilma, contra apenas 35% de Serra. Esta diferença é mais pronunciada entre os de menor escolaridade - dentre os quais o apoio ao "candidato do Lula" atinge 57%, sendo grande o potencial de crescimento de Dilma com o início da propaganda. Serra tem razão quanto a que a campanha só começa depois da Copa do Mundo; o problema é que o cenário tende a lhe ser ainda mais desfavorável.

Diante deste quadro, faz pouco sentido apontar erros na estratégia tucana, inquirindo o que o PSDB deveria fazer para virar o jogo, procurando culpados. A questão é outra: nada de extraordinário ocorrendo, tudo conspira a favor do situacionismo, pois este é um jogo em que as condições dos dois principais contendores são muito desiguais.

Cláudio Gonçalves Couto é cientista político, professor da FGV-SP.

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