Serra & Mayara, Piñera, Tea Party, Bush, Drowning Street, Sarkozy, Berlusconi, Bento XVI: Anauê!

(Chico Villela) 

Os últimos dias foram generosos em fatos, e todos vestem o mesmo modelito arcaico: expressam indignidades de extrema-direita.

Serra perdeu feio para Dilma, com mais de 12 milhões de votos de frente. Fez campanha inspirada por marqueteiros equivocados, acostumados a contemplar as maravilhas do império e a transplantar suas mudas para os trópicos, esquecendo-se das diferenças entre o país mais violento e assassino da história humana, com sua máquina de guerra mais poderosa de todos os tempos, e um dos países mais pacíficos dessa história humana, chamado Brasil. Ao final, em desespero, ergueu imagens de santos católicos em cerimônias religiosas como se fosse a taça da Copa, beijou outras imagens com devoção, comungou e rezou para as câmeras, e pediu auxílio ao papa, ignorando que a mão desse papa faz tudo virar pó ou coisa pior.


Serra fez o jogo das eleições brasileiras espelhado na campanha do movimento de extrema-direita Tea Party euamericano: temas religiosos e comportamentais no lugar de econômicos e políticos; campanhas de calúnias e falsas acusações (BHObama ia de ‘comunista’ a ‘agente muçulmano’), aborto incluído por obra e graça de sua esposa aborteira em segredo; fabricação de factóides alardeados em manchetes e nas vozes de bonecos de TV pelo país; instilação do medo e do terror na classe média; enfim, o feijão-com-arroz que ajudou a levar os democratas de BHObama à mais retumbante derrota de muitas décadas.

Após a derrota, o indigitado presidente coloca-se contra a maior parte do mundo com sua política FeDiana de atirar dólares de helicóptero, para desestabilizar o câmbio e prejudicar países-chave para sua decadência, com ênfase para Brasil, Rússia e China. Ganhará uma inflação crescente com estagnação econômica, garantia de vitória para seus adversários de extrema-direita em 2012.

BHObama tem saídas. Uma delas foi apregoada por colunista do jornalão Washington Post, que tem funcionado como porta-voz dos republicanos, ao feitio da Folha que ecoa as palavras de ordem do PSDB. Simples: a saída é a mesma de Roosevelt na grande crise de 1929: a guerra. Basta ir à guerra contra o Irã, diz o ‘jornalista’, que a economia saberá se recuperar. No Brasil não há essa opção: não temos inimigos aos quais levar a guerra e sua coorte de aberrações. [Embora Serra tenha prometido guerra permanente contra o governo.]

Mas os marqueteiros trapalhões da campanha nefasta de Serra não consideraram as defasagens fundamentais. Enquanto BHObama, como Bush, enfrentou a crise agasalhando bancos,  enchendo os bolsos dos banksters e ignorando na prática a população trabalhadora e as raízes da crise, com suas meias-medidas sociais insignificantes e a manutenção das guerras externas, o governo Lula foi rápido no gatilho e fugiu do tsunami que engoliu os EUA e boa parte da ‘Europa desenvolvida’ e Japão e países esparsos pelo mundo.

Como havia afirmado (e por isso ridicularizado por toda a grande mídia GAFE, Globo-Abril-Folha-Estadão), era só uma marolinha para nós. Mais uma para a GAFE deglutir. Ao contrário dos EUA, em que vastas camadas sociais de classe média mergulham em situações de pobreza e os pobres caem em abismo insondável (1 em cada 7 famílias do país depende de vales-alimentação para comer), no Brasil o movimento é contrário para dezenas de milhões. E Lula ainda teve sorte com as descobertas do pré-sal. Mas os espelhos dos marqueteiros de Serra distanciados da realidade não apresentavam essas imagens, só dogmas.

Tudo indica que, como o arcaico Tea Party, Serra vai ressuscitar e comandar, junto com o membro do odioso Opus Dei Geraldo Alckmin, um partido que ser reduzirá cada vez mais à expressão das plataformas da direita. Deixará de contar com a segunda força do antigo PSDB, o ex-governador e senador por Minas Aécio Neves. Ainda é cedo para prever os rumos de Aécio no comando da oposição democrática (fundar partido; associar-se a partido existente; desfalcar fileiras de outros partidos de centro; etc.). Mas tudo indica hoje que sairá do PSDB. Serra e Aécio não cabem mais no mesmo sofá; o ego de Serra preenche o vazio, e só deixa um cantinho para o ego de FHC. E o candidato natural em 2014 será Alckmin; nem Serra terá vez, a menos que dê um golpe em Alckmin, como deu em Aécio. O futuro é sempre uma caixinha de surpresas, inda mais num partido de negocistas e golpistas tarimbados.

A donzela Mayara aparece no título, não por mérito, mas apenas como exemplo e amostra: foi a primeira a agredir os nordestinos e desencadear a onda de idiotices e desinformação da parte de jovens em portais sociais da internet. Desconhecem, ou desprezam a informação, que Dilma venceu de lavada em Minas e no Rio, dois dos quatro estados mais ricos, e ganhou no Sudeste, a região mais rica e desenvolvida do país. Consta que já recebeu trocos suficientes: o pai que a apoiava com dinheiro mas não com afeto cortou sua mesada, foi despedida da empresa em que estagiava, e deve responder a processo por racismo e incitação ao crime instaurado a pedido da OAB Pernambuco.

Penso que não se deve magnificar a importância dessas manifestações: apenas exibem de novo os velhos preconceitos das camadas sociais nacionais dotadas de recursos e bens, que hoje assustam-se com a emergência da nova classe trabalhadora em ascensão – erroneamente chamada de ‘nova classe média’. Por enquanto, são apenas pequenos idiotas que se divertem na internet com textos mal escritos e idéias congeladas. O perigo é que cheguem assim à idade e à posição de Serra, quando então poderão exercer seu papel de grandes idiotas.

A derrota histórica de BHObama coincidiu com a ressurreição de outro grande líder da extrema-direita mundial, o ex-presidente George Bush filhote. Assessorado por um ghost-writer e, com certeza, por um ghost-thinker, Bush andou distribuindo sorrisos e mentiras em lançamentos de seu (!) livro autobiográfico. Em reiteradas declarações, eximiu-se de culpa pelas falácias prévias à invasão do Afeganistão e do Iraque, em 2001 e 2003. Declarou-se incomodado ao ser informado de que não havia armas de destruição em massa nas mãos de Saddam Hussein. Candidatou-se ao troféu ‘Cara de Pau’ do século XXI, e vai ser difícil ameaçá-lo nessa hegemonia.

Mas suas declarações criaram angústia e horror em seu velho aliado Reino Unido. De forma descarada, Bush defendeu o ‘waterboarding’, técnica de tortura, herdada da igreja católica da Idade Média, que simula as condições de afogamento da vítima torturada, alegando que recebeu informação jurídica de ser ‘legal’. Ainda não se sabe o que significa para a política e o futuro dos EUA a volta do velho canalha aos focos e holofotes.

A questão é que o governo em crise e decadente do Reino Unido tem se esquivado a esclarecer seu papel na coleta de informações com uso de tortura. E também não declara se valida a posição de Bush a favor da tortura e contra todos os avanços da humanidade desde as duas guerras européias do século passado. O silêncio de Downing Street é constrangedor.

A linguagem, como a vida, tece armadilhas. Downing Street 10 é um dos endereços mais conhecidos do mundo, a residência do premiê britânico. Mas drowning, do verbo drown, quer dizer matar por afogamento, ou morrer afogado, asfixiado e com água nos pulmões. Há certa parte da imprensa que já se refere ao endereço do primeiro-ministro conservador Cameron por Drowning Street, 10.

Tea Party, Sebastián Piñera, Serra, Cameron, Bush, velhas oligarquias européias, Sarkozy e sua boneca de luxo na França, Berlusconi e suas bonecas profissionais na Itália, todos eles se irmanam, como velhos embaixadores do passado. Mas Serra tem dois recifes na sua rota. Dilma/PT e seus aliados junto com boa parte da população são o mais proeminente. Mas o recife Aécio pode ser de maior letalidade para os planos do ex-líder de esquerda e agora velho fascista José Serra. [O único José do país que, ao contrário de todos os muitos milhões de xarás, não conseguiu ser Zé.]

E que agora anda de braços com a extrema-direita da igreja católica e fundamentalistas vendedores de indulgências de variados credos; a risível e empalhada Tradição, Família e Propriedade; os que saúdam Anauê sem receio do ridículo; os militares de pijama saudosistas dos velhos tempos repressivos;  a direita ativa da ditadura praticante do drowning e outras inovações; a imprensa aliada do GAFE, com sua incompetência, suas falsificações e suas bolinhas de papel; os empresários à la Boilesen,  financiadores da barbárie; enfim, a sempre presente e aética extrema-direita brasileira, herdeira dos colonizadores e seus seguidores e beneficiários. Em seu discurso pós-derrota, afirmou que irá defender “a pátria, a liberdade e a democracia”. O mundo conhece essa novilíngua, e, além disso, alguém já disse que a ‘pátria’ é o último refúgio dos canalhas.

Drowning Street pode ser contraponto enérgico a Downing Street. Aécio pode ser contraponto a aético. Vamos aguardar o futuro. Mas sem Mayaras: os idiotas grandes já desempenham o papel com profissionalismo.

Comentários

Mais Lidas

O que a mídia de celebridades faz com Anitta deveria ser crime

Guru de Marina disse que é preciso aumentar a carne e o leite

A parcialidade é o menor dos problemas da mídia golpista. Por Léo Mendes