GERAÇÃO SEM CAUSA VIRA FANTOCHE DA OLIGARQUIA

Caio Calazans



Dizem que 1968 foi o ano que não terminou. Símbolo da geração de nossos pais, que gritou, lutou, protestou contra a guerra, a ditadura, a censura, a opressão, a desigualdade e a exclusão social. Ditadura militar ferrenha no Brasil, guerra fria e conflito no Vietnã comendo solto no estrangeiro. Estudantes se juntavam a trabalhadores, sindicatos, organizações sociais e iam para a rua, enfrentavam a censura, as metrancas e cassetetes em um tempo em que o autoritarismo metia tiro na cabeça. Sem conversa, sem contemporização. Nosso Brasilzão sempre foi ditatorial, seja quando colônia, seja no império, na República Velha, Estado Novo e ditadura militar. Mesmo no breve período entre o Estado Novo e o militarismo, havia forte censura, extinção de partidos e repressão a movimentos populares.

Quarenta e sete anos depois, o Brasil vive sua “Nova República”, praticamente a primeira vez na história em que temos uma democracia com voto popular respeitado, sem censura oficial, com direitos políticos e civis respeitados. Um estado democrático que não é o mais perfeito (e qual é?), mas respeita as liberdades individuais, a liberdade de imprensa, de reunião, de associação, de pensamento. Os protestos do dia 15, assim como os do tão falado junho de 2013, só clarearam na minha cabeça um pensamento: Temos uma elite que não aceita a liberdade civil. E quando falo de elite, falo das oligarquias empresariais da comunicação que se fizeram graças ao apoio descarado à ditadura militar. Além dos coronéis do latifúndio, que continuam mandando e desmandando nos rincões do país. O show da mídia na cobertura dos protestos foi quase humorístico. Primeiro cem mil, depois duzentos mil, chegou a um milhão, um milhão e oitocentos mil, tudo segundo a polícia. Não conseguiram chegar a um consenso, divulgaram o que quiseram. É o que sempre fazem… mentir.



Foi triste ver gente pedindo intervenção militar, impeachment sem provas, fechamento do congresso, do STF, extinção de partidos políticos e, em alguns casos soluções até mais radicais como fuzilamento de corruptos. O preconceito contra nordestinos e pobres não ficou de fora, assim como o machismo sádico contra nossa presidente da República, uma mulher que tem história e merece respeito, independentemente da posição política de cada um. Fico pensando que gente é essa que vive num país que tanto sofreu com a ditadura militar, com a ditadura do Estado Novo, com o período imperial? Será que verdadeiramente amam o Brasil? Será que verdadeiramente o querem ver livre da especulação estrangeira, caminhando com as próprias pernas? Não é possível que sim… Gente que sai às ruas pedindo o fim da corrupção usando a camisa da seleção brasileira com o emblema da CBF, uma das instituições mais corruptas de todos os tempos!




Não pode ser sério, penso com meus botões. Confundem conceitos, embaralham argumentos e produzem uma maçaroca verborrágica que só tem sentido para sustentar o insustentável. Babam com as veias saltadas que a corrupção é culpa do PT, que nunca se roubou tanto no Brasil quanto hoje, que a Dilma e o Lula destruíram o Brasil. Seria piada se não falassem sério. Eles realmente acreditam nisso, não conhecem um pingo da história do Brasil. Percebe-se claramente o resultado de anos e anos de sucateamento da educação brasileira, da midiatização do preconceito, da sexualização, do sensacionalismo, do culto ao american way of life. Somos brasileiros, somos nada. Quem presta mesmo está ao norte do Equador. É a mensagem subliminar martelada na cabeça de nosso povo através da mídia vendida, covarde, asquerosa, mesquinha, pobre. Não é difícil perceber, basta ligar a TV.



Conte os negros e mulatos em comerciais, novelas (excluindo-se as posições subalternas ou estereotipadas), quantos negros apresentam telejornais, quantos são comentaristas. A partir dos anos 1990, as periferias começaram a aparecer um pouco mais. Uma vez que os chefões da mídia perceberam algo simples: eles também consomem. No entanto, ainda hoje, 25 anos depois, o principal espaço que possuem na maior rede de televisão brasileira é um programa que transforma a negritude em breguice chique de periferia, nunca em força criativa, inteligente com relevância. Assim como fizeram com o Carnaval, transformado em espetáculo “para inglês ver”. Depois que a negritude das comunidades sangra as mãos o ano todo costurando fantasia, a loira modelo/atriz/jornalista é quem aparece “sambando” na frente da câmera da Globo (a dona exclusiva do carnaval televisivo). Uma singela lembrança do modo de produção escravista, revisto e ampliado.

Dizem que o PT dividiu o Brasil, mas o país sempre foi dividido. Só não percebe isso quem não estudou nossa história e não se indignou com as revoltas sangrentas, os porões das ditaduras, a censura torpe, as destruições de jornais, revistas, assassinatos de jornalistas, representantes populares, políticos, os casos escabrosos de corrupção encobertos pela imprensa, entre outros exemplos numerosos de coisas que não estão nos livros didáticos. Temos visto o resultado desta pobreza intelectual em uma geração sem causa, sem propósito, sem rumo. Discurso de ódio político irracional, protestos carnavalescos sem chamamento à participação política de fato. Apenas a busca pelo avacalhamento das estruturas democráticas, algo que nossos pais e avós demoraram tanto para construir e pelo qual tantos outros morreram e foram torturados barbaramente. A juventude “globalizada” e “vejalizada” defeca pela boca os mantras de personalidades da estirpe de Lobão, Olavo de Carvalho, Roger Moreira, Reinaldo de Azevedo, Diogo Mainardi, Danilo Gentili, Rachel Sherazade, Silas Malafaia, Jair Bolsonaro, entre outros. Pessoas cujo único argumento ao serem contrariadas é a simples rotulação do outro (“você é petista”, por exemplo), a desqualificação do contrário. A estratégia perfeita dos covardes.




Dizem-se contra o comunismo como se estivéssemos em 1917, pedem intervenção militar sem ter noção do que isso faria com o país, reclamam dos impostos mas burlam o imposto de renda, reclamam dos preços mas compram sem reclamar, reclamam da violência mas nunca pisaram em uma periferia. São superficiais assim como aquilo que defendem, porque é o que podem defender. Querem o desenvolvimento para ontem, querem ser “Unitedisteites” a partir de amanhã. Na fábula construída pelos pobres mentores a quem seguem, tudo é possível, até o impossível. Vendamos a Petrobrás e os bancos públicos como vendemos a Vale do Rio Doce e as nossas empresas de telefonia. Afinal de contas o governo é incompetente para administrar, melhor dar na mão dos gringos. Foda-se o Brasil… Afinal de contas, as operadoras de telefonia hoje funcionam que é uma beleza, não é mesmo?

O espetáculo de ódio que as elites brasileiras produziram no último dia 15 foi vendido como grande manifestação popular. Desculpem, mas 1,8 milhões de pessoas em um país com mais de 200 milhões de habitantes não configura manifestação popular nem aqui nem na Conchinchina! A superficialidade desta mentira não resiste a uma simples conta matemática. Que este desabafo não seja rebatido apenas com a pecha de que é mais um texto “de petista”, porque petista não sou nem nunca fui. Porém não vejo problema em se ser petista, peemedebista, peessedebista ou qualquer outro “ista”. A democracia precisa de partidos políticos, de pluralidade de pensamento. Se os que temos não são bons, que se criem outros, que se reforme o sistema político, que se aperfeiçoe o que não funciona bem. A simples destruição não resolve.

Que esta minoria aparelhada não prejudique o processo democrático que nosso país está passando e que não será rápido e nem fácil. É minha única torcida. O Brasil precisa se livrar dos sanguessugas da mídia e seus fantoches metidos a politizados.

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