Neymar e a espetacularização do nada

Fabio Chiorino
Não era o homem pisando na Lua; era Neymar irrompendo o Camp Nou na apresentação oficial do Barcelona. Mas, para a imprensa brasileira, que nos últimos anos se dividiu em endeusar ou criticar severamente o jogador, era necessário ir além. Criou a editoria “Apresentação de Neymar”, em que cada detalhe ganhou uma comoção desmedida: a chegada ao aeroporto, a roupa do jogador, as Neymarzetes espanholas, as caras e bocas da namorada global, as imagens exclusivas do exame médico.

Os portais exibiram uma espécie de “tempo real” para cobrir o insignificante . Neymar almoçando na concentração, funcionários do estádio entregando copos de água aos torcedores, imagens incríveis do placar eletrônico. Em alguns momentos, parecia que estávamos diante de um conclave futebolístico. A cada minuto, uma atualização qualquer, desprovida de qualquer relevância.

Em um programa de TV, um debate acalorado sobre o número da camisa que usará o “astro brasileiro”. Só faltou consultarem um numerólogo para engrandecer a discussão. Em outro, o descritivo completo da primeira refeição de Neymar em Barcelona. Outro portal cobrava a participação das fãs no Twitter, pedindo a elas que registrassem em fotos a paixão pelo ídolo.

É possível notar ainda que a espetacularização não é exclusividade nossa. Os próprios veículos espanhóis exploraram a chegada de Neymar como o acontecimento do ano. Mas do lado de cá, a impressão é de que estamos apresentando para a Europa nossa melhor mercadoria, o menino dos gols de ouro, o jovem talento que precisou ultrapassar os limites sul-americanos. A imprensa brasileira adotou a postura de uma mãe orgulhosa, com lágrimas nos olhos, acompanhando os últimos passos do filhote sob a sua tutela.

Neymar não é só o maior jogador brasileiro da atualidade, mas também o de maior exposição e retorno publicitário. E a sua trajetória no Brasil muitas vezes se assemelhou a um comercial sem fim, sempre em busca do gol decisivo, do drible perfeito e do holofote mais bem posicionado. Agora, em solo europeu, surge a dúvida inevitável: será só mais um, ou o maior de todos? E aqui estaremos sedentos por curiosidades que virarão notícia. O que come por lá? Com quem divide o quarto na concentração? Como a namorada está se adaptando ao clima? Um boletim periódico sobre o nada. Um nada absoluto capaz de promover a paixão por algo que nem o torcedor sabe ao certo o que vem a ser.

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