Revista Veja se volta agora contra Veríssimo e Laerte

Da Redação - Conexão Jornalismo


Baixarias contra os dois também são ataques indiretos ao governo



O jogo democrático prevê a liberdade de expressão, bem como a contestação. Mas há que se atentar para o nível do debate.

Nos últimos dias, o escritor Luis Fernando Verissimo e o cartunista Laerte foram alvo de ataques contundentes, após terem publicado uma crônica e uma charge com críticas às manifestações pró-impeachment do último dia 15. Foram irônicos, mas realistas em suas ponderações e preocupações. Receberam de volta petardos desproporcionais e virulentos, grosseiros.

Laerte foi agredido por Reinaldo Azevedo, blogueiro da Veja. Verissimo, condenado por uma professora gaúcha, em texto divulgado por outro colunista da revista, Augusto Nunes. O escritor e humorista já havia sido atacado anteriormente por Rodrigo Constantino, também da Veja.

A estratégia é semelhante à que foi utilizada nos últimos meses contra o ator e articulista Gregório Duvivier, que ousou defender políticas e bandeiras do PT.

Leia a reportagem e veja as criações de Verissimo e Laerte que deram origem às pauladas:
A charge de Laerte foi publicada na última terça-feira (18), dois dias após os protestos contra o governo Dilma. Em muitas cidades, foram vistos cartazes e faixas com pedidos de volta da ditadura militar e de pena de morte para comunistas. Também se repetiram as selfies em que manifestantes ficaram em êxtase posando ao lado ou em meio a policiais militares. Inclusive em São Paulo, onde PMs são acusados de terem cometido, este mês, uma das maiores chacinas da história do país.



O cartunista pode ter carregado nas tintas, mas não é exagero dizer que nas ruas e especialmente nas redes sociais quem defende o impeachment da presidenta, eleita há menos de um ano, tem dado mostras de raiva e ódio, numa escalada crescente, que não consegue camuflar nos xingamentos e ameaças um "potencial" de violência extremamente perigoso - como já se viu tantas vezes na História.

O blogueiro Reinaldo Azevedo pode ter tentado, na Veja, dar uma resposta política... Mas no texto que ele publicou nesta segunda-feira (24) o que prevaleceu foi o preconceito e o baixo nível - logo de cara, no título: "A última da baranga moral!", um show de zombarias em relação à sexualidade do cartunista, do qual destacamos alguns trechos:

"Não é a mulher horrenda que há nele que o faz detestável, mas o que há de estúpido. E aí, meus caros, pouco importa como ele use os instrumentos com os quais o dotou a natureza." (...) "O exibicionismo certamente doentio de Laerte faz dele o mais famoso homem que se veste de mulher do país." (...) Em suma: o sujeito é esquerdista, gay, "transgênera" (seja lá o que isso signifique) e sempre tem, como disse Mencken, respostas simples e erradas para problemas complexos." (...) "Laerte já viveu segundo o que é - um homem - e agora decidiu viver segundo o que não é: uma mulher. Sugiro que tente experimentar o gênero humano."




É esse aí, o nível já conhecido de Reinaldo Azevedo, mas pelo visto cada vez mais fora de controle. Sem esquecer que seu alvo, dessa vez, foi um dos artistas mais conceituados do país em sua área de atuação, há muitos anos publicado pela Folha de S. Paulo, com constância e louvor. 


O caso Verissimo
Um dos mais prestigiados escritores do Brasil, campeão de vendas, colunista (também há muitos anos) de Globo e Estadão, foi atacado por uma professora do Rio Grande do Sul que diz ter dado aulas para suas filhas, muito tempo atrás, quando Verissimo era bem mais novo.

O jornalista Augusto Nunes não perdeu tempo, publicou com evidente satisfação o texto na Veja. Mas antes de vermos alguns trechos do que ela disse, é bom que se leia a crônica (curta) de Verissimo que os dois jornais publicaram no dia 20 (o gaúcho Zero Hora também) e que gerou a reação da professora.





Os manifestantes contra o governo sabem o que não querem - a Dilma, o Lula, o PT no poder -, mas ainda não pensaram bem no que querem.

Por Luis Fernando Verisssimo
Houve um tempo em que os cachorros corriam atrás dos carros. Era uma cena comum: vira-latas perseguindo carros, latindo, como se quisessem expulsar um intruso no seu meio. Às vezes viam-se bandos de cães indignados, perseguindo carros que passavam, e dava até para imaginar que um dia conseguiriam alcançar um, dos pequenos, pará-lo, cercá-lo e. E o quê? Comê-lo? Nunca ficou claro o que os cachorros fariam se alcançassem um carro. Era uma raiva sem planejamento. (Hoje, a cena de cachorros correndo atrás de carros é rara. Os cachorros modernizaram-se. Renderam-se ao domínio do automóvel. Ou convenceram-se do seu próprio ridículo).

Os manifestantes contra o governo sabem o que não querem - a Dilma, o Lula, o PT no poder -, mas ainda não pensaram bem no que querem. Se conseguirem derrubar o governo, que cada vez mais se parece com um Fusca indefeso sitiado por cães obsoletos, o que, exatamente, pretendem fazer com o vácuo? A política econômica atual é um sonho neoliberal. Seu oposto seria uma volta à política econômica pré-Levy? Dependendo de como for impedida a Dilma, o vácuo pode ser preenchido pela ascensão do vice-presidente (tudo bem), pelo eleito num novo pleito (seja o que Deus quiser) ou pelo Eduardo Cunha (bate na madeira). O que os manifestantes preferem? A raiva precisa de um mínimo de previsão.

Uma parte dos manifestantes não tem dúvida do que quer. Da primeira grande manifestação de 2013, passando pelas duas deste ano, o que mais cresceu e apareceu foi a linha Bolsonaro, que pede a volta da ditadura militar e lamenta, abertamente, que os militares não tenham matado a Dilma quando tiveram a oportunidade. Por sinal, o Fernando Henrique talvez se lembre que o Bolsonaro disse a mesma coisa a seu respeito. Mas, enfim, as guerras fazem estranhos aliados.

Sugiro a quem se preocupa com o momento nacional que faça um pouco de arqueologia histórica para manter as coisas em perspectiva. Procure na imprensa da época a reação causada pela marcha da família com Deus pela liberdade contra a ameaça comunista. Também foi uma manifestação enorme, impressionante. E foi o preâmbulo do golpe de 64, e dos 20 anos negros que se seguiram e hoje tanta gente quer ver de novo. Pode-se argumentar que os tempos eram outros, tão distantes que os cachorros de então ainda corriam atrás de carros, e a luta era outra. Mas o triste é que ainda é a mesma luta."




Se não foi vulgar como Azevedo, a professora Rosália Saraiva também saiu do tom em alguns momentos:
"Te enganas quando dizes que os cachorros de antes corriam atrás dos carros porque a luta era outra. Não, a luta é a mesma, o contexto é diferente. Os cachorros não querem um passaporte bolivariano. O vácuo vai ser preenchido, não te preocupes. Por quem for necessário e aceito, desde que não seja pelo exército do Stédile. (...) Não é verdade que o latido mais alto entre os cachorros foi o de um chamado Bolsonaro. Acho que estavas na França gozando das delícias de um croissant na beira do Sena (enquanto os vira-latas daqui corriam atrás do osso perdido) e não viste os vídeos das manifestações. Se bem que a TV Globo e o Datafolha também não enxergaram nada. (...) Atenciosamente, auauau."

Augusto Nunes festejou, disse que foi uma pancada no fígado de Verissimo, e acrescentou: "O rosnado de Verissimo nasceu do medo. O fim da era lulopetista pode custar-lhe a liderança que ocupa no ranking dos autores mais didáticos do Ministério da Educação. (Uma) grande resposta da professora das filhas de Veríssimo ao cachorrinho de madame que virou pitbull de quadrilheiro."


Luis Fernando Verissimo já havia sido atacado na Veja pelo blogueiro Rodrigo Constantino, após a publicação de outra crônica.


"Verissimo é um dos maiores ícones da esquerda caviar nacional, como os que já leram meu livro sabem. (...) O ponto é que esse texto, como tantos outros de Verissimo, vai entrar para a história como mais um equívoco gigantesco desse escritor. Sempre do lado errado da história, sempre defendendo o que há de pior para defender. Quando exumarem os textos de Verissimo - o filho, claro! - seus herdeiros morrerão de vergonha lá na frente."

Pode nem ser combinado, mas a iniciativa "conjunta" de tentar desqualificar ícones da nossa arte que se identificam com governos de esquerda certamente tem segundas ou terceiras intenções, além da esculhambação explícita. Vale tudo, não só para enfraquecer administrações que tenham uma ligação mais forte com movimentos populares e com os brasileiros menos privilegiados, e vale tudo também para minar suas bases de apoio, sejam quais forem os "inimigos" a serem atacados.

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